Pensão alimentícia: como calcular o valor dos alimentos
- Dra Bruna Cardoso
- 20 de set. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 15 de ago.

O valor da pensão alimentícia não segue uma fórmula matemática exata, pois envolve a análise individualizada de cada caso e para se chegar a um valor líquido e certo é aplicado um conceito fundamental do Direito de Família, chamado de “trinômio alimentar”, que representa a busca para uma solução justa e equilibrada para ambas as partes, utilizando três elementos essenciais: 1) a necessidade de quem está pedindo os alimentos; 2) a possibilidade financeira de quem está pagando os alimentos e 3) a proporcionalidade entre esses dois fatores.
A necessidade de quem recebe os alimentos engloba suas necessidades básicas, como alimentação, saúde, acesso à educação, cultura, lazer, dignidade e também visa assegurar que o alimentando tenha condições de vida adequadas para seu desenvolvimento integral.
Conforme dispõe o artigo 227 da Constituição Federal: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."
A possibilidade financeira de quem paga os alimentos será avaliada com base em sua renda, bens, dívidas e outras obrigações. Esse elemento garante que o valor da pensão seja justo e proporcional, evitando que quem recebe os alimentos obtenha um padrão de vida superior ao que teria caso a família continuasse unida.
Já a proporcionalidade entre a necessidade e a possibilidade tem a função de garantir que o valor fixado seja suficiente para garantir a qualidade de vida do alimentando, mas sem causar um prejuízo excessivo para quem paga os alimentos.
Os alimentos sob a perspectiva de gênero
Em fevereiro de 2021, o Conselho Nacional de Justiça publicou o Protocolo Para Julgamento Com Perspectiva de Gênero, que traz considerações teóricas sobre a questão da igualdade e destaca que a Justiça deve romper com os padrões de discriminação e preconceito que existem na sociedade, garantindo que todos tenham os mesmos direitos.
Ao analisar os casos de pensão alimentícia, os julgadores perceberam que, muitas vezes, as mães acabam sobrecarregadas com as tarefas domésticas e os cuidados com os filhos. Essa sobrecarga, que antes não era considerada, passou a ser levada em conta e assim, há o reconhecimento de que o trabalho das mães é essencial para o desenvolvimento da criança e que elas têm direito a uma compensação financeira justa.
Por exemplo: Ambos os pais trabalham a mesma quantidade de horas diárias, mas a mãe assume sozinha as responsabilidades com a criança, como a limpeza da casa, organização, lavanderia, compras de mercado, preparo das refeições, dar banho, prover alimentação, higiene pessoal, acompanhamento escolar, atividades extracurriculares, consultas médicas, administração de medicamentos, lida com as crises, educa, brinca, leva e busca a criança na escola e em outras atividades. Em contrapartida, enquanto o pai faz visitas em finais de semana alternados, e quando pega a criança, ela está de banho tomado, alimentada e arrumada. Quando devolve a criança o processo se repete, a mãe muitas vezes precisa alimentar, dar banho e preparar a criança para dormir.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua) do IBGE oferece dados que demonstram consistentemente que as mulheres dedicam um tempo significativamente maior a tarefas domésticas e cuidados com a família do que os homens. Por conseguinte a maternidade solo impõe desafios complexos às mulheres, que precisam conciliar as responsabilidades de criar um filho com as exigências do mercado de trabalho.
A dificuldade em equilibrar trabalho e família gera estresse e exaustão, impactando a produtividade profissional e a saúde mental. A sobrecarga de tarefas limita as oportunidades de crescimento profissional e aumenta a vulnerabilidade à pobreza. Além disso, a falta de tempo livre dificulta a manutenção de uma vida social ativa e a construção de relacionamentos afetivos, isolando muitas mães solo e afetando sua qualidade de vida.
Obviamente existem casos em que o pai é mais participativo, ou a mãe possui funcionários que a auxiliam nessas atividades, logo cada caso precisa ser analisado dentro do cenário daquela família. Fato é que existe a possibilidade de incluir os custos referentes a essa sobrecarga no valor a ser pago pelos alimentos.
Como calcular no valor da pensão alimentícia
Embora não exista uma fórmula matemática a ser utilizada para o cálculo, é possível descobrir o valor da necessidade efetuando a soma de todas as despesas da criança. A lista de despesas deve incluir todos os gastos, incluindo os gastos de moradia, alimentação, vestuário, material escolar, médico, atividades extras e lazer.
Passo 01: Crie uma lista de gastos
Faça uma lista com todas as contas da sua casa (aluguel, água, luz, internet, condomínio, mercado) e coloque o valor de cada uma ao lado. No final, some tudo para descobrir o total.
Exemplo:
PASSO 02: Dividindo as contas de casa e encontrando o custo individual
Para saber quanto cada pessoa que mora na casa paga pelas contas, use o valor total calculado anteriormente e divida pelo número de pessoas que moram na residência. Isso inclui você, seu filho(a) e todos os outros que moram com vocês. Por exemplo, se você mora com seu filho(a), sua mãe e seu pai, divida todas as contas por 4.
Se os alimentos forem para duas ou mais crianças, o cálculo é parecido. Divida o total de despesas pelo número total de pessoas da residência (incluindo você e seus filhos). Repita esse cálculo para cada criança. Assim, você terá um valor individual para cada filho.
Exemplo 01: R$ 3.000,00 / 4 = R$ 750,00 por pessoa e essa é a parcela de despesa da criança na moradia. Se são duas crianças, multiplique o valor encontrado por 2: R$750,00 * 2 = R$ 1.500,00.
PASSO 03: Liste as despesas que são exclusivas da criança
Exemplo:
PASSO 04 - Encontre o valor total gasto com a criança
Some o valor individual das despesas com moradia com os gastos exclusivos.
Exemplo: R$750,00 (passo 02) + R$ 700,00 (passo 03) = R$1.450,00 de gastos com a criança.
PASSO 05 - Encontre o valor a ser custeado por cada genitor
As despesas da criança devem ser divididas em 50% para o pai e 50% para a mãe, pois é dever de ambos os pais custear as despesas. Sendo assim, divida o valor total gasto com a criança por 2: R$ 1.450,00 (passo 04) / 2 (pai e mãe) = R$ 725,00.
PASSO 06 - Os alimentos sob a perspectiva de gênero
Verifique se o caso se enquadra na perspectiva de gênero, na qual um genitor é mais sobrecarregado pelas tarefas do dia a dia e o cuidado com os filhos. Adeque o valor a ser custeado (passo 05) dentro da perspectiva de gênero.
Ao final o valor encontrado será o valor mínimo que deverá ser pedido para a pensão alimentícia. Entretanto, o valor que será fixado pelo julgador será baseado nas informações apresentadas no processo, incluindo as provas dos custos das despesas e a adequação do valor dos alimentos na ótica do trinômio alimentar.

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